Os primeiros
homens viviam em cavernas. Os últimos esquimós ainda vivem em seus iglus. Em
muitas regiões, as cabanas indígenas têm o formato côncavo. O útero materno é
côncavo. As mãos que se estendem para acolher um presente também assumem o
formato de uma concha.
Depois
disso, admira que o Natal do Salvador tenha ocorrido na gruta de Belém e que Nossa
Senhora ainda goste de aparecer em grutas, como em Lourdes, na Massabielle? Bem
próximo ao coração [kardia], situa-se
o ventre [koilia], esse espaço
côncavo, aberto, acolhedor, que o texto grego utiliza, às vezes, para traduzir
o hebraico rahamim, designativo das
“entranhas de misericórdia” de nosso Deus.
Sim, a
Igreja de Jesus Cristo tem a função de um espaço de acolhida, uma “morada” que
se torna uma “casa alternativa”, uma “casa ao lado” ou paróquia [para / oikos]. No polo oposto das sinagogas excludentes (só dos libertos,
só dos imigrantes, só dos tecelões...), a Igreja é casa aberta a todos e seria
condenada a murchar e fenecer caso se contentasse apenas em manter os que já
“estão dentro”.
A Igreja é
“matriz”, “madre”, porque gera em seu útero a nova vida de cada batizado, aliás,
mergulhado no espaço côncavo da pia batismal, antigamente situada no côncavo da
cripta do templo. Mas não basta que ela seja “matriz”, deve ser também
“nutriz”, oferecendo ao novo fiel o prato (aliás, côncavo) com o Pão da Palavra
e o Pão da Eucaristia.
Sem esse
alimento permanente, os novos filhos não saberiam crescer. O Ícone da Galaktotrophousa mostra Nossa Senhora a
amamentar o Filho. Seios fartos que transmitem vida e vigor. Para crescer, a
criança precisa de alimento [trophé].
Isto explicaria que tantos fiéis passem a buscar alimento em outra mesa?
Não podemos
ficar de braços cruzados – sinal de fechamento em nós mesmos. Ao contrário, é
hora de abrir os braços, como na bela imagem do Sagrado Coração de Jesus em
nossa paróquia de Minduri. O gesto bivalente da estátua combina admiravelmente
a bênção e o abraço acolhedor.
Ora, a
História da Salvação é feita de abraços. O Espírito Santo abraça a jovem Maria
na Anunciação. Maria abraça Isabel na Visitação [cf. grego, aspasmós]. A Mãe abraça o Filho na gruta
de Belém. Simeão abraça o Menino na Apresentação. A Mãe aflita abraça o Filho
recuperado no Templo. Por que ficaríamos nós com os braços cruzados?
Talvez nos
falte, ainda, receber – num Pentecostes pessoal – aquele abraço de fogo com que
o Espírito cauterizou feridas e derreteu geleiras, transformando toscos pescadores
e frios cobradores de impostos em incendiários da fé.
Em tempo: o
Cenáculo foi a primeira “casa” da Igreja. O espaço interior da Última Ceia foi
também o espaço de onde partiu a primeira evangelização. Não é uma casa onde se
vive de portões trancados, mas o foco de onde se parte para arrombar as portas
e gritar ao mundo que Cristo venceu a morte e nos convida a uma vida nova no
Espírito.
Antônio Carlos Santini
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